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sábado, março 24, 2007


As duas diásporas 

A obra-prima do Quaresma foi vista na televisão em Soham. Trata-se de um pequeno bastião de imigrantes portugueses nesta zona de Inglaterra, uma espécie de (very) Little Portugal. Foi muito engraçado ver o jogo como se estivesse num qualquer café em Portugal, com a Super-Bock e a deliciosa bifana servida às 10 e meia da noite (impossível arranjar comida num pub depois das 9 e meia), o vernáculo ordinário e brejeiro mas não ofensivo, a oportuna piada da nova Adidas “trivela”...
Mas o aspecto mais marcante da experiência foi constatar a profunda diferença entre a vida do imigrante “académico”, como eu, e a do imigrante “operário”. Embora me entretenha a registar diferenças culturais e tenha maiores afinidade e empatia com compatriotas e latinos em geral, sinto-me bastante confortável em Cambridge; o estatuto de estrangeiro não é opressivo. Só recentemente me apercebi da existência de um grande número de Portugueses em Cambridge que não têm ligação à Universidade. Não nos cruzamos, frequentamos meios diferentes e só agora começo a constatar que tudo o que a academia me proporciona e que é tão importante no meu quotidiano não lhes está acessível. E são neles muito evidentes a ansiedade social típica de quem se sente deslocado e a frustração de quem, sem estar em dificuldades finaceiras, não consegue o sucesso esperado numa terra que até parece estar cheia de oportunidades. Para eles a Pátria está longe e as idas a Portugal continuam asceticamente a ser anuais ou, quando muito, bianuais. O advento da RyanAir e da EasyJet não parece tê-los abrangido, talvez porque a necessidade de poupar seja preponderante e talvez porque a Internet ainda não lhes faça parte da vida.
A forma como escrevi estas frases ilustra a sensação de que há o “nós” e o “eles”...
Daí a importância de aglomerados como Soham, da mercearia portuguesa lá existente (onde se pode comprar bacalhau, o atum Bom Petisco e o Omo) e de cafés como aquele em que vi o Portugal-Bélgica, centro único da vida social daquele grupo de homens.
Os privilegiados do nosso tempo são os que têm acesso à formação, ao saber, à cultura e à informação. Cada vez mais os desequilíbrios sociais são motivados por assimetrias a esse nível. E a maior tragédia é que as pessoas não estão a ser educadas com este princípio.

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